quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Pérolas perdidas do cancioneiro nacional / O Peso - Lúcifer

[Postagem originalmente publicada em 13/06/2011, de autoria de Edu Verme]





Em 1974 a cena musical rock brasileira se dividia em muitas vertentes, se apoiando em bandas que, durante os anos 60, tocavam o rock que vinha de fora, mas que na década seguinte encontrariam seus caminhos e sonoridades próprias, juntamente com novas bandas que procuravam novos caminhos. Algumas delas seguindo a escola do Yes e Genesis, nomes muito populares à época, e outras seguindo caminhos mais pesados, os discípulos de Iommi. O Peso foi uma banda um pouco cearense e bastante carioca que escolheu seguir o segundo caminho. Suas composições exalavam fúria cega, mesmo em temas românticos como "Sou louco por você" e "Boca louca". Luiz Carlos Porto já apresentava sintomas da doença que viria a o tirar dos palcos em breve: a esquizofrenia (ou ao menos sua postura no palco exalava esquizofrenismo). E é impressionante o poder que sua voz alcança, a maneira de jogar com as palavras e de cantá-las de maneira torta, cruel e ameaçadora. Certamente uma das melhores gargantas do nosso rock and roll nacional, uma maneira atípica de cantar, com muita personalidade (coisa difícil em terras tupiniquins). Não me envergonharia nem mesmo de colocar Porto entre os grandes vocalistas do rock mundial! Ele não só usava sua voz: ele entregava sua mente e seu corpo, seja em gravação de estúdio, seja ao vivo (as imagens d'O Peso no Hollywood Rock estão aí pra mostrar a energia do cara no palco).


O som do Peso era, como seu nome já denunciava, pesado. Inclusive as letras. Nada escapava à metralhadora sonora d'O Peso: sexo ("Boca louca", "Sou louco por você"), drogas ("O Pente", "Eu não sei de nada", "Cabeça feita"), rock'n'roll ("Blues") e... o cramulhão ("Lúcifer")!!!


"Lúcifer" é nossa pérola do cancioneiro nacional da vez.

Lúcifer
http://www.youtube.com/watch?v=I5yYr3IbqLA

Lúcifer é mais uma das composições nacionais a tratar do tema "satanismo". A letra é um misto de "Sympathy for the devil" dos Stones, com "Black sabbath", do Sabbath. O som é um rock encorpado, pesado, Gabriel O'Meara presenteia a composição com um riff principal típico do rock'n'roll, meio abluesado. O piano muito bem colocado acompanha a música toda nas mãos de Constant Papineau. O baixo de Carlos Scart fecha a cozinha ao lado do baterista Carlos Graça, que não deixam o pique cair. O vocal é alucinado, Porto parece querer ferir os ouvintes com seu vocal rasgado e fora de sí. E a letra... bom, a letra é um show à parte. Assim como em 'Sympathy...', quem assina a mensagem é o coisa-ruim em pessoa:
"Pode deixar comigo que eu me encarrego da tua felicidade/
Eu vou tirar tuas mágoas, em troca quero tua alma."
Ou ainda:
"A vida é curta, mas curta é pra curtir/
Você irá longe, mas longe perto de mim/
Pode deixar comigo que eu tomo conta de todos meus amigos."
No final, a conclusão é inevitável:

"Lúcifer reina no mundo/
Lúcifer reina no fundo/
Do coração de todos vocês."


Infelizmente a banda não durou. Realizaram shows memoráveis, agregaram uma legião de fãs, mas problemas internos levaram à banda ao colapso. E nada mais de inédito surgiu. Carlos Porto lançou um álbum solo em 1983, mas totalmente inexpressivo. Após isso afundou ainda mais na sua doença, e inclusive dizem que atualmente nem ao menos lembra que participou da banda, apesar de sua voz continuar cada vez melhor.


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